Podridão floral
A Podridão Floral dos Citros (PFC) é uma doença causada por fungos que afetam flores de citros. Essa doença também é chamada de “queda prematura de frutos cítricos”. Popularmente, é conhecida por “estrelinha” ou colletotrichum.
A podridão floral é uma das mais importantes doenças fúngicas da citricultura nas Américas, devido aos enormes prejuízos que causa a pomares de diferentes espécies e variedades. As perdas variam em função da quantidade e da distribuição de chuvas durante o período de florescimento. Os danos estão associados ao número de eventos consecutivos de chuvas com períodos prolongados de molhamento. As epidemias da doença são explosivas quando esses períodos de molhamento ocorrem várias vezes durante o florescimento.
Trata-se de uma doença de difícil controle, pois os fungicidas, quando aplicados em condições climáticas muito favoráveis à doença, podem ter a eficiência comprometida. Além do controle químico — principal estratégia de manejo da podridão floral —, é recomendável utilizar outras medidas que contribuem para antecipar, uniformizar ou reduzir o período de florescimento, bem como o monitoramento constante da florada e do clima.

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Agentes causais
A doença é causada por diferentes espécies do gênero Colletotrichum. Até 2011, o agente causal era apenas a espécie C. acutatum, mas, em 2018, foi verificado que a espécie C. gloeosporioides também causa sintomas de PFC. Recentemente, C. acutatum e C. gloeosporioides passaram a representar dois complexos formados por diferentes espécies. Com isso, a espécie C. abscissum, que pertence ao complexo C. acutatum, passou a ser o principal agente causal da doença. Espécies de ambos os complexos podem causar sintomas em flores de citros, porém mais de 80% das lesões de podridão floral no estado de São Paulo são causadas por espécies do complexo C. acutatum.
Hospedeiros
A podridão floral afeta praticamente todas as variedades comerciais de citros. A taxa de expansão das lesões ou a intensidade dos sintomas nas pétalas varia pouco entre as espécies.
As flores de laranja-doce, independentemente da variedade, apresentaram suscetibilidade semelhante ao patógeno. No entanto, a doença tem causado danos mais severos em laranja ‘Natal’ e em laranjas que apresentam vários surtos de florescimento, como a ‘Pera’. Grandes prejuízos também têm sido reportados em limões e limas-ácidas. A laranja ‘Valência’ e os tangelos apresentam danos moderados, enquanto a laranja ‘Hamlin’ e outras variedades precoces, bem como os pomelos, geralmente apresentam menos problemas relacionados à podridão floral. Dependendo do porta-enxerto e das condições ambientais, o período de florescimento de uma mesma variedade de copa pode ser antecipado ou retardado, interferindo na intensidade da doença.
Danos e perdas
A podridão floral é uma doença típica das Américas e pode ocorrer de forma repentina e explosiva quando as condições climáticas são favoráveis. No Brasil, a doença tem ocorrido nas diferentes regiões e estados que produzem citros. No estado de São Paulo, a doença causou prejuízos significativos, especialmente nas décadas de 1970 e 1990. No florescimento de 2009, as condições climáticas foram muito favoráveis à doença, resultando em perdas de até 85% na produção de plantas, principalmente no sudoeste paulista. Na Flórida (EUA), a doença causou severos danos na década de 1990. Na América Central, também tem causado problemas em pomares de citros de diferentes países.

Sintomas
Os primeiros sintomas de podridão floral podem aparecer entre dois e sete dias após a infecção. Inicialmente, formam-se lesões alaranjadas nas pétalas e lesões negras no estigma e no estilete. Os frutinhos ainda recém-formados ficam amarelados e caem prematuramente. Após a queda, os cálices permanecem retidos nos ramos por vários meses, sendo popularmente chamados de “estrelinhas”. Esse sintoma pode ocorrer mesmo em botões que não apresentaram sintomas visíveis nas flores.

Além da queda dos frutos, as folhas localizadas próximas aos botões florais contaminados ficam distorcidas. Em geral, flores infectadas apresentam abscisão dos frutos e retenção dos cálices, embora, em alguns casos, os cálices também possam cair junto com os frutos.


Ciclo da doença
1) O fungo Colletotrichum sobrevive entre as floradas por meio de estruturas de resistência, como os apressórios, presentes em folhas de citros ou de plantas daninhas. Quando inicia o florescimento, a água das chuvas transporta os extratos das flores para as folhas, induzindo o fungo a produzir os esporos. Esses esporos são então carregados pela chuva das folhas para as flores, dando início às infecções e à formação dos sintomas.
2) As flores infectadas produzem novos esporos do fungo em grandes quantidades, favorecendo a ocorrência de novas infecções em outras flores, o que inicia epidemias severas no pomar.
3) Após a infecção das flores, há um aumento na produção de hormônios vegetais, como o etileno e o ácido indolacético, que induz a queda dos frutinhos ainda verdes e pequenos, com retenção dos cálices nos ramos.

Período crítico de infecção
A infecção por Colletotrichum ocorre principalmente quando os botões florais estão nas fases de exposição do tecido branco das pétalas. Após a infecção e colonização dos tecidos pelo fungo, a planta produz hormônios que causam a abscisão dos frutinhos jovens. Nas fases de botão verde fechado e de chumbinho, o fungo não infecta os tecidos, mas sua tentativa de penetração pode estimular a produção hormonal e provocar a queda dos frutos e a formação das “estrelinhas”.
As fases mais críticas são as de botão expandido e flor aberta, seguidas pela fase de botão branco pequeno.
O período de florescimento pode ser influenciado pela temperatura e pela variedade. Como o fungo é capaz de germinar e infectar flores em temperaturas entre 10 °C e 30 °C, o efeito da temperatura sobre a duração do período de florescimento das plantas é, normalmente, mais importante do que seu efeito sobre o fungo.

Condições climáticas favoráveis
As epidemias estão associadas à ocorrência de chuvas e períodos prolongados de molhamento. Quando há períodos de molhamento superiores a 48 horas ocorrendo duas ou mais vezes durante o florescimento, as infecções das flores aumentam exponencialmente. O orvalho, por sua vez, não prolonga o molhamento por mais de 15 e 16 horas e, por isso, não é responsável por epidemias explosivas na maioria dos pomares paulistas.

Controle
As medidas de prevenção são aquelas que contribuem para que a florada seja uniforme e não ocorra no período chuvoso.
Irrigação: Antecipa a “quebra” do estresse hídrico, favorecendo o florescimento antes da estação chuvosa. Além disso, a florada é mais uniforme, evitando a ocorrência de novas infecções.
Adubação: Contribui para evitar floradas desuniformes ou surtos de florescimento. Uma planta bem nutrida pode sofrer menos danos com a doença.
Pomar sadio: A eliminação de plantas debilitadas e a manutenção da sanidade do pomar evitam a ocorrência de surtos de florescimento antes da florada principal.
Controle químico
Os fungicidas recomendados e incluídos na ProteCitrus (Produtos para Proteção da Citricultura) pertencem aos grupos das estrobilurinas (inibidores de quinona externa, QoI) e dos triazóis (inibidores da desmetilação de esteróis, DMI) (ver abaixo). O carbendazim, o tiofanato-metílico e o mancozebe, que eram utilizados no controle da doença, foram retirados da ProteCitrus (antiga Lista PIC) em 2012 e não são recomendados para uso em pomares que destinam sua produção à exportação, como para suco de laranja.
Volume de calda
As aplicações para o controle da podridão floral são realizadas com volumes de calda variáveis em função do volume de copa das plantas. Os volumes de calda entre 20 e 50 mL de calda/m³ de copa são os que apresentam melhor relação custo-benefício no controle da podridão floral. Embora volumes inferiores a 20 mL/m³ tenham mostrado eficiência em alguns testes de campo, não são indicados para uso em larga escala, pois o controle da doença tende a ser mais variável em comparação aos volumes entre 20 e 50 mL/m³ de copa.
Fungicidas e adjuvantes
As misturas formuladas de triazol + estrobilurina são as mais eficientes no controle da doença.
O controle químico deve ser feito com critério e planejamento. Recomenda-se não realizar mais de três aplicações por safra com fungicidas do mesmo grupo químico e evitar o uso isolado de estrobilurinas. O uso excessivo das estrobilurinas ou dos triazóis no controle da podridão floral pode acarretar seleção de fungos resistentes a esses fungicidas. É importante ressaltar que, na Flórida (EUA), já existem relatos de C. acutatum (de morango) resistentes às estrobilurinas e, no Brasil, de Alternaria alternata (causadora da mancha marrom em tangerinas) com resistência a esse grupo de fungicidas.
A adição de óleos minerais ou vegetais à calda fungicida pode promover aumento da eficiência dos fungicidas em condições muito favoráveis à doença. No entanto, as misturas de estrobilurina + triazol têm apresentado alta eficiência de controle da podridão floral mesmo quando aplicadas sem adjuvantes. Os adjuvantes organosiliconados, por sua vez, não apresentam aumento da eficiência de controle da doença quando adicionados em calda fungicida.

Sistema de previsão
O Sistema de Previsão da Podridão Floral foi desenvolvido pelo Fundecitrus em parceria com a Esalq/USP e a Universidade da Flórida. Ele calcula os riscos de ocorrência da doença com base em dados de temperatura e molhamento, que permitem estimar a germinação dos esporos do fungo. Esses dados são enviados automaticamente ao sistema por estações meteorológicas instaladas em diferentes propriedades citrícolas.
Quando as condições climáticas são desfavoráveis à podridão floral, o sistema indica “risco baixo” (círculo verde). Quando favoráveis, emite alertas aos usuários. O “risco moderado” (círculo amarelo) indica condição favorável apenas em pomares com histórico de podridão floral, em regiões propensas e com florescimento nas fases de “botão expandido” e “flor aberta”. No caso de “risco alto” (círculo vermelho), a condição é favorável à doença em todos os pomares, regiões e fases do florescimento. Adicionalmente, o sistema emite um alerta de “risco extremo” (círculo vermelho escuro) logo após a ocorrência de 2 ou 3 dias consecutivos de chuva, indicando que a condição está muito favorável e as áreas mais críticas devem ser pulverizadas novamente.
Os riscos são calculados para os locais onde estão instaladas as estações meteorológicas. Por isso, é recomendável que o citricultor possua uma estação meteorológica em sua propriedade ou esteja próximo a no máximo cinco quilômetros de alguma estação já existente no sistema. A utilização do sistema por meio do acesso aos dados de outras estações meteorológicas muito distantes de sua propriedade pode resultar em problemas.
Para que o sistema seja realmente eficiente na prática, o citricultor deve ter a capacidade de proteger toda a fazenda no prazo máximo de 3 a 4 dias. Assim, quando for emitido um alerta de risco extremo, todas as áreas críticas devem ser imediatamente protegidas.